quarta-feira, 15 de abril de 2009

Artigo

SEXUALIDADE E CIVILIZAÇÃO

PREFÁCIO

Freud denomina a civilização geradora de neuroses

Atribui também o aumento do número de doenças mentais aos danos produzidos pela civilização industrial moderna.
Inova quando dirige suas críticas à moral sexual civilizada e não aos gêneros e ritmos de vida impostos pela civilização industrial. Isto o conduziu a abordar o problema da educação como agente direto da propagação da neurose. A educação é um processo de desenvolvimento e de maturação inscrito parcialmente no patrimônio genético da criança o qual é o produto da história da humanidade.
A antinomia que Freud pensa ter descoberto entre sexualidade e civilização reaparecerá no interior da relação educacional. O problema exposto por Freud ao nível da civilização, é o mesmo que a educação tem de resolver concretamente: conciliar o desenvolvimento da criança, me direção à civilização, com a manutenção de sua capacidade de ser feliz. Já nessa época surge a suspeita de poderia existir no âmago da civilização uma outra dimensão, diversa do princípio do prazer compatível com as necessidades de sobrevivência.
A noção de civilização, na obra de Freud, é flutuante e pouco definida.
O termo civilização se refere, em certos casos, à civilização ocidental de fins do século XIX, a de seus doentes, ela própria doente do desenvolvimento de um germe que Freud situa miticamente no momento do pacto primordial que sucedeu ao assassinato do pai primitivo.
A noção de civilização acabou se tornando, quase um sinônimo da lei de renúncia do gozo.





CAPÍTULO I - A MORAL SOCIAL

1893 – Primeiras críticas de Freud à civilização: neuroses atuais (daquela época)
• neurastesia
• neurose de angústia

 opostas às psiconeuroses da defesa (originadas essencialmente do psíquico)
 resultantes da insatisfação sexual, conseqüências do onanismo e coitos interruptos

1º atrito – sociedade x sexualidade sadia
• medicina profilática para evitar D.S.T. (sífilis e blenorragia)
• soluções para a mesma: masturbação e relacionamento entre rapazes e moças de boa família, isto é, saudáveis.

 prejudicados pelo malthusianismo

“Na ausência de qualquer solução possível, a sociedade parece condenada a tornar-se vítima de neuroses incuráveis que reduzem ao mínimo a alegria de viver, destroem as relações conjugais e pela hereditariedade, trazem consigo a ruína das gerações vindouras”. (Freud, num enfoque exclusivamente médico).

• esperança de descoberta de método anticoncepcional eficaz e inofensivo;
• esperança de conciliar as exigências da sexualidade com a vida econômica;
• posteriormente, ataca a moral social e educação daquele tempo;
• assume posições éticas, alicerçado na psicanálise clínica;
• etiologia da histeria e neurose obsessiva (psiconeuroses de defesa) modifica os dados do problema e o enfoque de Freud;
• neurastenia e neurose de angústia (transtornos atuais da função sexual) x “psiconeuroses de defesa”(histeria e neurose obsessiva): conflito do ser humano de natureza sexual com seu “ideal de pureza”.

 A consciência se recusa em aceitá-lo e conseqüentemente tentar solucioná-lo, “finge” ignorá-lo e esse conflito psíquico será expresso pelos sintomas dessas forças.

• Freud cita como patogênico: a falta de representações sexuais (moralidade do sujeito).

 moralidade: fruto da educação
 índice maior de neuroses nas classes sociais onde a educação atua.
“Dado que o esforço de defesa do Eu depende de todo o desenvolvimento moral e intelectual da pessoa, será agora menos incompreensível para nos o fato de a histeria ser muito mais rara nas classes baixas do que deveria permitir sua etiologia específica.”

Educação castradora:
• da atividade social;
• dos pensamentos a ela direcionados;
• seria fruto só das exigências sociais?

Conseqüências:
• recalques
• permanência no inconsciente, geradora de neuroses.

Por ser contra a moral sexual de sua época, Freud viu-se rejeitado nos meios médicos.
Tabus sexuais são outros entraves que bloqueiam a investigação científica: interdição do sexo e do pensamento.
Na prática analítica a proibição pesa sobre o pensamento, formando o núcleo da neurose:
• Atividade científica e profilaxia das neuroses exigem a transformação da moral social.

 Vencer a resistência de uma geração de médicos;
 sobrepujar pais orgulhosos que se acreditavam ser melhores, perante os filhos;
 combater a hipocrisia insensata de mães, que acreditavam estarem acima de neuroses.

• Surge a necessidade de discussão dos problemas de vida sexual, buscando a opinião pública, sem se considerar um explorador de instintos mais baixos.

Necessário às exigências de nossa sexualidade: que haja além da liberação dos costumes, a liberação da palavra e do pensamento.
A psicanálise opera pela palavra:

 a cura analítica deve conduzir o advento de uma palavra no lugar do sintoma.

A psicanálise demonstra que é a falta de uma palavra verdadeira o que dá origem ao sintoma, o qual vem ocupar seu lugar.
Uma ética fundada na palavra é uma ética de verdade.
A neurose é o fruto de uma mentira que não passa da falta de palavra, que nem sempre expressa a verdade.

 é fruto de uma educação bem-pensante, mas que proíbe pensar.

Freud denuncia abusos de uma moral sexual que além de reprimir os atos, proíbe as intenções e os pensamentos, castrando a atividade intelectual.

 isso são os “maus pensamentos”, criados pela religião, particularmente a cristã.

“Freud não se limita à crítica: tenta dar uma interpretação analítica que vai ao âmago das relações entre civilização e sexualidade”.

CONCLUSÃO

Na vasta obra de Freud, apesar desta ter sido, de início, predominantemente voltada para a questão clínica, encontra-se a preocupação de se construir uma compreensão - sempre orientada através de uma ótica voltada às suas investigações clínicas-, sobre a condição humana. Para ele a humanidade e sua cultura é uma patologia, e assim ele desenvolve todo seu trabalho sem dissociar o patológico encontrado no indivíduo do patológico identificado no comportamento da sociedade e da civilização.
Todo o edifício teórico da psicanálise está fundado na compreensão do sujeito perante suas defesas e estratégias para interagir com o mundo externo através daquilo que ele consegue identificar como sendo o seu ser, o qual se move na busca incessante de realizar seus desejos.
Sobre esta abrangente afirmação, Freud constrói com sua obra, um vastíssimo conjunto de descobertas, que vêm fundar um saber original sobre os mecanismos mais profundos do ser humano. Consegue, através da investigação clínica associada a uma sólida formação intelectual, sistematizar, em grande parte, o funcionamento daquilo que pode ser considerado a pedra angular de todo o saber psicanalítico: o inconsciente. Suas descobertas vão gradativamente identificando fenômenos e relações causais neste universo até então enigmático para a humanidade, delineando a prevalência do inconsciente sobre a vida humana. Inicialmente, interpretando os sonhos dos seus pacientes, e os seus próprios, Freud vai consolidando com invejável rigor científico um vasto campo teórico no qual assentaria a psicanálise. Paralelamente a esta investigação do microcosmo do ser humano, este constrói uma ponte teórica entre o ser humano e a civilização, não deixando de identificar uma forte relação causal entre o sofrimento neurótico do ser humano e o próprio processo civilizatório em que o mesmo está imerso. É sobre este traço do pensamento freudiano, o desenvolvimento da civilização e sua relação na estruturação psíquica do indivíduo, aqui identificado como o seu pensamento social, que se buscará refletir.


Millot, Catherine – Freud Antipedagogo – Rio de Janeiro, Zahar, 1987, p. 10 a 17.

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